PREVIDÊNCIA TEM DÉFICIT GIGANTESCO E FUTURO PREOCUPA

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O governo está discutindo nesta semana mudanças da aposentadoria, mas só para quem entrar no sistema da Previdência depois que elas tiverem sido aprovadas no Congresso. O governo tem repetido que os direitos dos trabalhadores da ativa não vão ser afetados.

Ivo Gomes Barbosa já tem idade para entrar de graça no ônibus. Poderia usar o banco dos idosos, mas o banco que ele precisa usar é outro. São 66 anos, 47 como motorista e não tem nem ideia quando vai botar o pé no freio.

Jornal Nacional: Por que não para de trabalhar?
Ivo: Porque é muito baixa a aposentadoria. Só dá pra comprar remédio, não pode nem pensar em ficar doente, porque tudo está caro.
Jornal Nacional: Quando o senhor pretende parar?
Ivo: Enquanto o patrão me aceitar na empresa e eu tiver condições de trabalhar, vou continuar.

André Reis, 14 anos, já aprendeu essa lição. Falta muito tempo para ele sair da escola e ainda mais para se aposentar. mas ele já pensa nesse dia, graças às suas duas contadoras.
“Isso é uma poupança, só que privada, para quando você tiver mais idade para você se aposentar”, explica a mãe.

Exagero? Não, é sorte. A tia e a mãe entendem muito bem de números. Por isso, ele tem previdência privada desde os nove anos de idade.

Patrícia Gimenez, contadora: Eu explico pra ele a realidade da vida. A gente não vai viver a vida toda e ele tem que ter consciência de que a gente tem que ter uma poupança.
Jornal Nacional: Mesmo que seja pra usar esse dinheiro daqui a 50 anos?
Patrícia: Com certeza, principalmente, só daqui 50 anos.
Jornal Nacional: De vez quando dá vontade de comprar um tênis novo, usar esse dinheiro?
André: Dá muita vontade, mas sei que não pode, sei que é independência pro meu futuro desse dinheiro, se precisar sei que vou poder contar com meus pais e não dessa poupança, que é para o meu futuro.

André é o futuro e Ivo, o presente de uma realidade: dificilmente vai dar para contar com a Previdência Social quando a nossa capacidade de trabalhar chegar ao fim da linha.

Para que o sistema de aposentadoria funcione, precisa ter a forma de uma pirâmide. Na base, muitos jovens, que trabalham e pagam a Previdência. No topo, um número menor de pessoas, que recebem aposentadoria.

No Brasil, a pirâmide está ficando com a base estreita porque as mulheres têm menos filhos. Há 30 anos, eram quatro filhos para cada brasileira; hoje, 1,8. Além disso, a população brasileira está vivendo mais, o que faz o topo ficar mais largo. A tendência é que essa proporção aumente. E é fácil concluir o que acontece com uma pirâmide de cabeça para baixo.

Os brasileiros se aposentam em média perto dos 55 anos, mas a expectativa de vida, que era de 52 anos na década de 1960, hoje passa de 75 anos.

Hoje, a previdência dos trabalhadores urbanos ainda apresenta superávit, ou seja, o INSS arrecada mais do gasta com os aposentados: no ano passado foram mais de R$ 5 bilhões, mas a tendência – com o envelhecimento – é esse número diminuir e o temor é que, em breve, vire prejuízo.

Hoje a Previdência já tem um gigantesco déficit, causado pela aposentadoria dos trabalhadores rurais. O total no ano passado foi de quase R$ 90 bilhões e pode chegar a quase R$ 130 bilhões este ano.

O governo gasta muito e os aposentados recebem pouco. Hoje, a maioria ganha o salário mínimo e poucos recebem o teto.
As regras de aposentadoria variam para funcionários públicos, rurais e de empresas privadas. Alguns se aposentam por tempo de serviço, outros pela idade ou uma combinação dos dois critérios.

Muitos especialistas defendem que se crie uma regra única, com idade mínima para todos e que ela suba conforme o aumento da expectativa de vida da população. Isso ajudaria a evitar que a pirâmide desabe.

“Temos que enfrentar rápido porque, se não, a tragédia se aproxima e aí nós teremos, no limite, que cortar benefício daqueles que hoje ou que no futuro venham a receber aposentadorias e pensões. E essa é a pior situação que pode se pensar em termos de previdência. Porque aquele que tiver seu benefício cortado ele já não terá mais capacidade de gerar renda porque é idoso”, afirma Paulo Tafner, professor da Universidade Cândido Mendes.

A consultoria Mercer comparou os sistemas de aposentadoria de 25 países. O Brasil ficou no meio da tabela. Ganhou nota C. Não é dos piores, mas está longe do ideal. Para a consultoria, um dos problemas é a excessiva dependência da Previdência Social. Hoje, somente três em cada 100 brasileiros – como o André, lá do início da reportagem – tem previdência privada.

“Tentar aumentar incentivo fiscal para empresas, para indivíduos, para que eles possam poupar, para que eles possam contribuir para Previdência, e assim você tira a carga de alguma forma da Previdência Social e lá na frente, tanto o indivíduo ganha com benefício maior, quanto o país porque esses recursos são investidos, podem ser investidos de forma a longo prazo e aí os dois podem sair ganhando”, explica Bruna Borges, consultora sênior da Mercer.

A consultoria diz que acabou a época em que o Estado consegue garantir o bem estar dos trabalhadores. Para quem está no mercado de trabalho, não será fácil. Significa poupar mais e trabalhar mais. Mas muitos especialistas dizem que não há escolha.

“A Previdência não corre o risco de quebrar. Quem corre o risco de quebrar é o pais. Isso porque os governos transferem os recursos arrecadados para pagar as despesas previdenciárias. Mas, ao fazer isso, ele vai estar tirando recurso de educação, de saúde, de investimento, então o país quebra”, diz Paulo Tafner.

A Confederação Nacional da Indústria é a favor da exigência de uma idade mínima para aposentadoria para os novos trabalhadores e da equiparação entre homens e mulheres. Ideias que centrais sindicais, como a CUT, rejeitam.

O governo pretende apresentar a proposta de reforma em 60 dias.

“Não há uma posição fechada do governo neste momento. A presidente Dilma tem uma posição clara de, no prazo de 60 dias, tomar iniciativa de apresentar ao Congresso propostas de modificação que possam atualizar as regras em um cenário de sustentabilidade”, afirma o ministro da Previdência, Miguel Rossetto.

Fonte: g1.globo.com