O Brasil ficou velho antes de ficar rico

De acordo com o Helio Zylberstajn, da Universidade de São Paulo (USP), a Previdência no Brasil está se aproximando de “um cenário grego”.

O professor falou ontem no VIII Fórum Nacional de Seguro de Vida e Previdência Privada em São Paulo.

“De cada 3 reais que o estado brasileiro recolhe, um vai para a Previdência. Se somar com juros, vai quase toda a receita. E como vai economizar dinheiro com juros se não mexer na Previdência?”, questiona.

Temos o 13º maior gasto com Previdência entre 86 países, mas apenas a 56ª população mais idosa entre eles.

De um universo de 177 países, somos um dos únicos treze que permitem aposentadoria por tempo de contribuição sem idade mínima – e em 5 desses, essa possibilidade só existe se o aposentado deixar o mercado de trabalho.

Cenário

A questão de fundo é que as mulheres estão tendo menos filhos e as pessoas estão vivendo mais – com isso, mais gente recebe aposentadoria e por muito mais tempo, enquanto há menos jovens trabalhando e colocando dinheiro no sistema.

O Brasil viveu a transição demográfica de forma muito mais rápida do que os países ricos, o que está drenando recursos da sociedade para o sistema previdenciário.

Em outras palavras: o país envelheceu antes de ficar rico, “e se ficar velho é ruim, ficar velho e pobre é horroroso”, brincou Paulo Tafner, diretor da Companhia Fluminense de Securitização.

O modelo da Previdência brasileira “não é justo nem sustentável”, completa José Cechin, com passagem longa pelo Ministério da Previdência no governo Fernando Henrique e atual diretor do FenaSaúde.

“Não gosto dessa ideia de bomba relógio pronta para explodir. Ela está explodindo todos os dias. Do jeito que vai, vai levar o Tesouro junto.”

Ideias

Um dos novos modelos sugeridos para o sistema teria dois pilares. O primeiro seria assistencial: universal, independente de contribuição, financiado por impostos e que garantiria uma renda básica para todos os idosos.

O segundo seria contributivo: cada um financia a sua, com opção de escolha no mercado, o que poderia envolver também mudança nas regras para rentabilizar e sacar FGTS e outros benefícios.

Outra ideia é de criar uma uma idade mínima de aposentadoria progressiva, que poderia aumentar algo como 6 meses a cada ano. Um dos maiores desafios seria definir as regras de transição entre o sistema velho e o novo.

A maior parte dos palestrantes insistiu que é melhor ter regras diretas, igualitárias e de simples compreensão, mas Cássio Turra, do Departamento de Demografia da UFMG, alertou que a expectativa de vida é muito diferente entre regiões e classes sociais:

“No momento os diferenciais [nos grupos populacionais] são muito grandes e isso deveria ser levado em consideração no caso brasileiro para que a gente não penalize os mais pobres”.

O governo do presidente interino Michel Temer trabalha para apresentar em breve uma proposta de reforma com os eixos de idade mínima, diferença entre os sexos e diferença entre as profissões.

“Todas as reformas anteriores tocaram pontos, mas não olharam o sistema como um todo, que atende muito bem a alguns requisitos e muito mal a outros. A taxa de cobertura é alta, por exemplo, mas o sistema dá um incentivo incorreto para que as pessoas saiam logo do mercado de trabalho. Mesmo se não houvesse a mudança demográfica, haveria um problema de desenho”, diz Luis Eduardo Afonso, professor da FEA-USP.

O sistema não estava preparado, por exemplo, para fenômenos como a maior participação feminina no mercado de trabalho. Pegue o acúmulo de benefícios: em 1992 apenas 8% das mulheres pensionistas também recebiam aposentadoria. Agora, são 37%.

População e política

O desafio é como passar uma reforma diante da desinformação popular, que muitas vezes oferece respostas contraditórias para o problema, como mostrou uma pesquisa divulgada no mesmo evento.

66% dos brasileiros são a favor de uma idade mínima para aposentadoria, mas 76% não concordam que isso signifique que elas se aposentem mais tarde. Só 30% concordam que quem quiser se aposentar mais cedo receba benefícios menores.

O momento de desencanto com a classe política também faz com que seja difícil pedir sacrifícios para a população, especialmente diante das incoerências do ajuste fiscal aplicado até agora.

Um dos palestrantes destacou que grandes reformas costumam ter sucesso quando acontecem em primeiro ano de mandato, com aglutinamento das forças políticas e altos níveis de aprovação popular após uma campanha de discussão exaustiva – o que não é o nosso caso.

Mas nada disso muda o fato de que o problema simplesmente terá que ser enfrentado e que o custo de não o fazer sobe a cada dia:

“O tempo para agir é agora, o tempo para agir é ontem, o tempo para agir não é daqui alguns anos”, disse Larry Hartshorn, vice-presidente da Limra, associação internacional de seguros.

Fonte: www.exame.abril.com.br